Na Era do ChatGPT, Qual o Papel do Elemento Humano na Escrita?

Luiz Mário

10/12/20245 min read

Chat GPT
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"10 medidas de cevada e 5 ovelhas fornecidas para o templo. A festa da colheita em honra da cidade de Uruk".

Esta inscrição, simples e objetiva, poderia muito bem ter sido registrada em uma tabuleta de argila na Suméria, cerca de 3.200 a.C. Naquela época, a escrita surgiu como uma das mais extraordinárias invenções da civilização, sendo uma ferramenta essencial para o registro de transações comerciais, celebrações religiosas e eventos importantes. Esses primeiros sistemas de escrita não eram apenas formas de comunicar o que acontecia no presente, mas também de preservar a memória e o legado de uma sociedade.

Os sumérios foram os pioneiros nesse campo, desenvolvendo o sistema cuneiforme, que era gravado em tabuletas de argila. Esse sistema foi fundamental para a organização da sociedade, pois permitia registrar e organizar dados de forma eficiente, o que era crucial para a crescente complexidade das cidades e impérios da época. Não se tratava apenas de marcas em barro, mas de uma verdadeira expressão da capacidade humana de interpretar e dar sentido ao mundo ao seu redor. Os registros cuneiformes representavam a habilidade dos seres humanos de construir uma narrativa sobre suas vidas e atividades, e esse processo de construção do conhecimento dependia totalmente de quem escrevia e de quem lia.

Mais ao sul, no Egito, os hieróglifos começaram a ser utilizados por volta de 3.100 a.C. Diferente dos sumérios, os egípcios empregavam símbolos pictográficos para registrar os feitos de seus líderes, os faraós, bem como para inscrever textos religiosos que preservavam a sua visão de mundo. Entalhados em monumentos ou escritos em papiros, os hieróglifos carregavam uma riqueza simbólica que apenas escribas altamente treinados conseguiam decifrar e reproduzir. O elemento humano aqui não era apenas técnico; havia também um poder espiritual e político atribuído àqueles que dominavam essa nova tecnologia, já que eles tinham o privilégio de eternizar histórias e conceitos em uma sociedade profundamente religiosa.

No entanto, foi por volta de 1.200 a.C. que a escrita sofreu uma grande transformação com a criação do alfabeto fenício. Esse avanço simplificou enormemente o processo de escrita, substituindo os complexos sistemas de símbolos por um conjunto limitado de caracteres que representavam sons. Essa simplificação fez com que a escrita fosse acessível a uma parcela maior da população, expandindo a comunicação para além das elites letradas. Embora o alfabeto tenha facilitado a codificação e decodificação das ideias, o ato de escrever continuava intrinsecamente humano. As palavras não tinham vida própria; precisavam de alguém que as organizasse em frases, as estruturasse em narrativas e lhes desse sentido.

Avançando na linha do tempo, durante a Idade Média, a escrita passou por um período crítico de preservação graças ao trabalho dos monges copistas. Nos mosteiros, esses homens dedicavam suas vidas à preservação do conhecimento, copiando manualmente manuscritos sagrados e obras clássicas. Em uma época em que o mundo se reorganizava após a queda do Império Romano, os textos, que poderiam ter desaparecido para sempre, eram cuidadosamente reproduzidos à mão. Cada palavra copiada representava um esforço de dedicação e habilidade, e o papel humano era essencial não apenas na cópia mecânica dos textos, mas também no enriquecimento com comentários e glosas que refletiam o contexto intelectual e espiritual da época. A sabedoria e a visão de mundo de cada copista influenciavam o que era preservado para as gerações futuras.

O próximo grande avanço no mundo da escrita veio com Johannes Gutenberg e sua invenção da prensa de tipos móveis no século XV. A impressão de livros em massa revolucionou a difusão do conhecimento. Livros, que antes eram caros e demoravam anos para serem produzidos, agora podiam ser replicados em uma fração do tempo e do custo. Isso democratizou o acesso à leitura e ajudou a espalhar ideias de maneira muito mais rápida e eficaz. No entanto, o elemento humano não desapareceu com essa revolução tecnológica. Pelo contrário, escritores, editores e pensadores passaram a moldar o conteúdo dos textos impressos, decidindo o que deveria ser publicado e distribuído, e como esse conhecimento impactaria o mundo. A criação das ideias e sua disseminação ainda eram conduzidas pela intenção e intelecto humanos.

Com o advento da máquina de escrever no século XIX, o ato de escrever foi novamente transformado. A tecnologia tornou o processo mais eficiente, possibilitando a produção rápida de textos. A máquina de escrever se tornou um símbolo da modernidade, especialmente nas mãos de jornalistas e escritores, que podiam responder de forma ágil às demandas de um mundo cada vez mais veloz. Contudo, a ferramenta continuava sendo apenas isso: uma extensão da mente humana, que continuava responsável por estruturar pensamentos, narrar histórias e expressar sentimentos por meio da palavra escrita.

No século XX, o computador e a escrita digital trouxeram outra revolução. A capacidade de criar, editar e armazenar grandes volumes de texto com rapidez e eficiência redefiniu o processo de escrita. Documentos podiam ser revisados infinitamente e compartilhados instantaneamente ao redor do mundo. Mesmo assim, o processo criativo e a organização dos pensamentos em palavras continuaram sendo responsabilidades humanas. A escrita digital abriu portas para uma nova forma de democratização do conhecimento, permitindo que mais vozes fossem ouvidas, mas a essência da criação ainda dependia das ideias, intenções e expressões humanas.

Hoje, estamos na era da inteligência artificial, com sistemas como o ChatGPT capazes de gerar textos de maneira autônoma. Essas ferramentas são extremamente úteis, economizando tempo e ampliando a capacidade de produção escrita. Porém, a automação não elimina o papel do ser humano. Ferramentas de IA dependem de supervisão, interpretação e ajuste humanos para garantir que o conteúdo faça sentido, seja relevante e cumpra seu propósito. O toque humano na escrita, a capacidade de comunicar emoções, construir argumentos convincentes e criar narrativas significativas, ainda é o que dá à escrita seu valor mais profundo.

Assim, a história da escrita, desde suas origens nas tabuletas de argila até o presente, demonstra que, independentemente das tecnologias disponíveis, o elemento humano permanece insubstituível. Cada avanço trouxe novas ferramentas, mas o poder da escrita como meio de comunicação e expressão sempre esteve enraizado na capacidade humana de moldar e interpretar o mundo por meio das palavras.

Agora é a sua vez de participar dessa jornada!

Continue explorando a importância do elemento humano na escrita, compartilhe suas experiências e visões conosco nos comentários. Siga o blog para mais reflexões sobre a evolução da comunicação, a escrita e o papel das novas tecnologias. Juntos, podemos continuar a moldar o futuro da palavra escrita.

Vamos manter viva a essência da escrita humana!

Referências:

Robinson, A. (2007). A História da Escrita. Record.

Menocal, M. R. (2002). The Ornament of the World: How Muslims, Jews, and Christians Created a Culture of Tolerance in Medieval Spain. Back Bay Books.

Ong, W. J. (1982). Orality and Literacy: The Technologizing of the Word. Routledge.

Houston, S. D. (2004). The First Writing: Script Invention as History and Process. Cambridge University Press.